quarta-feira, 7 de abril de 2010

A Garota do Poço

Era um dia escuro, sabe se lá porque e alguma coisa me intrigava. Fui andando assim como quem vai fazendo a obrigação a qual é designado. E sentada num banco eu a avistei, estava lá contemplativa e ao mesmo tempo irrequieta como alguém que lê algo e não esta entendendo – talvez seja assim que você esteja se sentindo. Mas bem ou mal acho que já a conhecia ou pelo menos adoraria, e tenho certeza que se não fosse o acaso pra fazer esse encontro eu mesmo o faria.

Pois bem, sentei-me. O tempo é relativo, não sei quanto dele se passou até o momento que de surpresa ela me arrematou aflita: “Sabe moço que de ansiedade eu sou um poço, fico querendo consumir tudo de uma vez toda a minha vida”. O dia ainda era escuro e, todavia eu ainda mais intrigado estava. Quem diria me sentar ao lado de um poço tão profundo. E no que ela ia falando de como se atrapalhava ao tentar fazer os seus desejos e do quanto errava em tudo e se arrependia, eu fui achando que mais bela, humana e parecida comigo e todo o resto ela não ficaria. E os seus dois grandes olhos de tudo os detalhes mais importantes, tanto que não eram detalhes. Eu acreditei que eles fossem os poços aos quais ela se referia... Finalmente depois da cheia de tudo o que ela confusamente exprimiu, pude parar e refletir ou na verdade contemplar pois acho que por fim entendi. Então pude emendar: “Moça não nego tua ânsia que de todas deve ser uma das maiores das inconstâncias dessa vida que é tão humana, mas sabe não se afogue nas águas que enchem esses dois poços que trazes, deixe isso para mim, tire deles pequenos baldes em doses pausadas ou nem tanto e não se esqueça de viver até o fim. E se precisar comigo pode contar pois sou pequeno mas meus ombros são fortes para que desses poços eu possa retirar um mar”.

O dia ainda se fazia escuro. Ela olhou-me espantada e grata, com um olhar de vergonha e ternura e viu toda minha (im)provável resposta entrar-lhe nos ouvidos e no seu coração fazer raiz. Ou pelo menos assim entendi, quando o seu sorriso pude admirar. A pequena então me abraçou e deixou um pouco do oceano que trazia consigo fluir. Eu o abraço devolvi e com um pouco de embaraço antes de me despedir fitei seus grandes olhos e corroborei o que entendi. “Moça ainda peço que agora depois disso tudo solte essa luz que esta aí presa e deixei-a inundar todo o mundo.”

Fui-me embora sem olhar para traz. Indo com minha missão cumprida, olhei ao redor e vi toda a luz voltar. Foi um dia de plena luz para mim e a garota do poço.

Um comentário:

  1. Lindo lirismo!
    “Moço ainda peço que agora depois disso tudo solte essa luz que esta aí presa e deixei-a inundar todo o mundo.”
    É pra ti que se acha um homem de vida pouco realizável, é só um menino em busca de sonhos sempre possíveis!

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